A corrida por ser melhor cansa

Vivemos em busca de valores paradoxais – ser feliz com o simples, mas buscar sempre mais. Porque temos medo de ser medianos? Porque queremos nos diferenciar? Como diferenciar os ruídos das pressões sociais, daquilo que te traz felicidade?

Cara a cara com as nossas frustrações

A pandemia causou um impacto impossível de ignorar na vida de muita gente este ano. Um amigo muito querido — que estava se aproximando da independência financeira, mas teve seu progresso interrompido pela crise —  ao celebrar seu aniversário, contou estar sentindo-se mal, como quem envelhece e não sai do lugar, que fica pra traz.

Diante da minha tentativa de valorizar as conquistas da trajetória, ele pondera: “é como se, numa corrida de 1000 eu estivesse, em 600º lugar”. Um pouco mais pra traz ou pouco mais pra frente, estar entre os do meio nos parece ruim, desanimador, sinal de fracasso.

Na juventude a gente sonha com esse ideal de destacar-se, de nos afastar da mediocridade pouco atraente dos adultos da vida real. Porém, ao adultecer, nós, apesar das conquistas, também descobrimos que algumas ambições da juventude não estão exatamente próximas da nossa realidade. É frustrante, não é? Consegue pensar em alguma destas não-realizações em sua vida?

Para aplacar a frustração, ao não conseguir estar no topo de todas as categorias, escolhemos ao menos uma em que nos destacamos mais e nos aferramos a ela: “posso não ser o melhor profissional, mas sou um pai excepcional”, “não sou dos mais inteligentes mas sou divertido como ninguém”, “posso não ser popular, mas sou a comprometida em ajudar minha comunidade”. Te dou um minuto: qual é o seu palco de destaque?

Essas ideias costumam trazer conforto, mas são frágeis. Toda a segurança sobre a identidade que construímos para nós mesmo, se abala tão logo nosso pódio seja ameaçado por outros “pais excepcionais”, “amigos divertidos”, “ou filantropos engajados”. Já sentiu isso? A sensação de ser destituído do seu trono?

Abraçando a mediocridade

O meu ponto é aceitar a beleza da mediocridade, de olhar pros outros e ver neles, não seres superiores ou inferiores, mas semelhantes: mais chegados nisso, menos experientes naquilo e medíocres na maioria das coisas.

Eu gosto de pintar. É uma das coisas que me traz felicidade. E eu sou absolutamente medíocre pintando. Outro dia, num momento de exaltação da minha mediocridade, postei uma pequena aquarela e escrevi: “não sou boa, mas fico feliz em ser média em várias pequenas coisas”.

Um amigo, tentando ser gentil veio, indignado, pedir que eu não dissesse tal coisa, afinal, ele sempre me viu como alguém “cheia de confiança” e não estava me reconhecendo.

Nessa conversa eu perceber que a medida que fui abraçando minha mediocridade, eu não me sentia menos confiante, nem menos potente. Apenas mais livre, livre para não superar expectativas.

​Não é que eu não consiga criar belezas pintando, nem que eu desgoste das belezas que eu crio. Mas aceitar que elas são médias é amar o que eu crio plenamente. É amar o que eu fiz do jeito que eu fiz, sem indulgências, ou exageros e sem a pressão de só gostar quando for “melhor”, melhor que eu mesma ou melhor que os outros.

A mesma maneira, aceitar minha mediocridade não é diminuir o meu valor. Não é perder a crença em mim ou nas coisas que eu posso fazer, mas me libertar para fazê-las sem a obrigação de compará-las, ou de buscar superação. Sabendo que sempre haverá parâmetros de comparação no nosso dia a dia e que não podemos escapar deles (salário, especializações, posses), abraçar a mediocridade é abraçar o seu valor mesmo que ele seja perfeitamente ordinário em algumas das comparações.

Ressignificar a mediocridade é amar a mim e a minha trajetória mesmo sem corresponder idealizações, na linha da autocompaixão. E também é amar aos meus irmãos todos e as suas trajetórias incondicionalmente, enxergando a profunda beleza de suas trajetórias, que não são iguais às de ninguém, mas que muito provavelmente, são médias como as de muitos.

E você, já abraçou sua mediocridade hoje?

Baseado no texto de 
Gabriella Feola para www.papodehomem.com.br
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