TENHO VERGONHA, E AGORA?

A vergonha é um dos sentimentos mais difíceis de trabalhar em terapia pela dificuldade em ser compartilhada. Guarda-se a vergonha muito fundo na memória, enquanto permite-se emergir sentimentos de medo, culpa, ineficiência, baixa auto estima, desvalia, insegurança, abandono e tantos outros.
Tal processo com a vergonha começa muito cedo. A criança criar o sentido da vergonha como um sentimento ligado ao medo de não ser amada e de ser abandonada. Quanto mais jovem e portanto mais dependente, maior é a ameaça à sua sobrevivência e mais intenso e doloroso é o envolvimento emocional.
Mesmo mais tarde quando já sente-se apta a discernir, ao encontrar-se diante de alguma falta ou falha num padrão interno, o cérebro recupera automaticamente a memória do trauma. O indivíduo é levado ao momento e lugar de sua infância onde experimentou os erros pelas primeiras vezes. Por só ter registrado fortes emoções fica sem poder trazer à tona a compreensão do ocorrido, então novamente sente-se ameaçado e reage com comportamentos desajustados à sua condição adulta.
Algumas pessoas chegam a afirmar sentirem-se como uma criança diante de críticas ou elogios, tornando-se incapazes de responder. É fácil imaginar que um olhar inesperado possa dificulta a travessia do saguão, um comentário deixar mudo um apresentador, ou ainda parecer um verdadeiro desastre entornar um copo na mesa de jantar assim como tantos outros exemplos.

Mas o que fazer diante da vergonha?

Na prática clinica tanto quanto na literatura encontramos exemplos de soluções, cuja eficácia vai depender mais do indivíduo que sofre, do que do terapeuta que orienta ou das técnicas utilizadas.
Particularmente gosto de aplicar a “Imaginação Ativa” como técnica, mas o ponto de partida sempre é o indivíduo com seus receios até para pedir ajuda.

Objetivando a solução, vale mais perguntar “para que serve” do que perguntar “por que sinto” ou “como começou“, visto que estas últimas olharão para o passado e aquela primeira pergunta poderá apontar uma saída.
A resposta será sempre individual, mas terá tanto mais resultado quanto mais intensos forem os sentimentos envolvidos. Apenas pensar sobre o evento e responder as questões acima poderá solucionar apenas parcialmente a questão.
Recomendo fazer uma ação concreta.
Procure um lugar tranquilo e um momento sem risco de ser interrompido bruscamente.

Relaxe e escreva.
Comece por descrever a situação incômoda. Talvez escrevendo várias linhas e até mesmo parágrafos sobre uma situação vergonhosa significativa. Expresse também o que sentiu.
Em seguida observe-se no presente. Passe a descrever o que sente. Tente identificar partes do corpo que possam chamar sua atenção. Novamente descreva de forma abundante o que acontece nestes lugares do corpo.
Quando esgotarem as descrições, o próprio corpo poderá mostrar alternativas e sugestões que ampliem ainda mais as sensações, entregue-se também à imagens, cenas e acontecimentos que brotarem na mente, mas siga sempre escrevendo.

Termine de escrever quando achar adequado.
Tenha como regra encerra o texto com paz e gratidão.
Mais tarde releia seu texto se necessário.
Guarde-o sem partilhar por algum tempo, mantenha-o para si mesmo como se fosse uma semente recém plantada aguardando para germinar.


Referências:

Sobre vergonha: “A Coragem de Ser Imperfeito” de Brené Brown

Sobre Imaginação Ativa: “A Chave do Reino Interior” de Robert A. Johnson

imagem: Bia Nauiack

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